domingo, maio 29, 2011

Nem Guerra Nem Paz

"Nem Guerra Nem Paz" (Love & Death), com Woody Allen e Diane Keaton, realizado por Woody Allen, maluquices de Woody Allen (como explicar que o Velho Nehamkin seja mais novo que o Jovem Nehamkin?!), problemas existenciais de Woody Allen (a subjectividade é objectiva!). Comédia alucinante que decorre no período das invasões napoleónicas à Rússia, é Woody Allen no seu melhor. Infelizmente é também Woody Allen no melhor da sua malandrice, e fosse a minha memória do filme um pouco mais exacta não teria achado que era boa ideia vermos este filme com o Martim, depois de termos visto Guerra e Paz. Enfim, não vamos deixar todas as novidades para as conversas com os colegas, não é?... (gaita!).

P.S.: Li uma crítica particularmente interessante, na Amazon, de forma que vou transcrever um pouco da mesma (o link para as críticas é http://www.amazon.com/Love-Death-Woody-Allen/product-reviews/0792846095/ref=cm_cr_pr_hist_5?ie=UTF8&showViewpoints=0&filterBy=addFiveStar)

Bring your brain and your funny bone (Jason A. Beyer)

Is this movie funny? Absolutely! [...] But of all the Woodman's films, this one may also be one of the smartest. Yes, it parodies the pre-existentialist novels of Dostoyevsky and Tolstoy (though Tolstoy much more so), but it does it in a way that's intellectually stimulating and VERY faithful to the tradition these writers helped to launch. Allen isn't just parodying this tradition--he's displaying a deep commitment to this tradition as well. [...] Examine the movie closely, and you will find running throughout the themes emphasized by much of the best existentialist writings. [...] This is a rare movie; one that has the power to challenge us intellectually and morally, if only we choose to let it reach us.

Guerra e Paz

Adaptação ao cinema do grande clássico de Tolstoi, compactado em 200 e poucos minutos, com Henry Fonda, Audrey Hepburn e Mel Ferrer e realizado por King Vidor. Fica-me na memória a cena de Pierre Bezukhov, qual sociólogo ou turista (não repórter) de guerra, no meio da batalha entre tropas napoleónicas e do Czar, sujeito a levar um balázio a qualquer momento. Gostámos do filme, mas é certo que a sensação final, mesmo ao fim de 200 minutos, fica bem descrita pela seguinte citação de Woody Allen:
"I took a course in speed reading and was able to read War and Peace in twenty minutes. It's about Russia."
O mesmo Woody Allen que realizou o filme que vimos a seguir.

segunda-feira, maio 16, 2011

Filmes - Momentos de Glória

Na semana passada vimos o filme "Momentos de Glória", um velho favorito da Rita. É pena ter de ver os filmes a prestações, à razão de 30-45 minutos por sessão, mas não há alternativa: é isso ou não ver. Ao som da banda sonora de Vangelis, uma história a valorizar o esforço, a busca do sonho. Mais um filme de construção de carácter. Afinal, não é isso que deve ser um bom filme?

quinta-feira, maio 12, 2011

A política do passado

...que nada, mas nada, tem a ver com a política de hoje...

Durante o período legislativo desse ano, Alípio Abranhos fez ainda dois discursos, um, sobre política colonial, outro, sobre o projecto do Caminho de Ferro de Leste. Este último é sobremodo eloquente: poder-se-ia chamar a Ode ao Caminho de Ferro.
Nunca o utilitário modo de comunicação foi descrito com tal colorido, com tal vigor de imaginação: «Vede-lo – exclama o orador – esse monstro de ferro, soltando das narinas turbilhões de fumo, semelhante ao Leviatã da fábula! (bravo! bravo!) Vede-lo,
atravessando como um relâmpago os mais áridos terrenos: e que maravilhoso espectáculo se nos oferece então: ao contrário do cavalo de Atua, cuja pata fazia secar a erva dos prados, por onde passa este novo cavalo de fogo (bravo! bravo!) brotam as searas, cobrem-se as colinas de vinha, (muito bem! muito bem!) penduram-se os rebanhos nas encostas verdejantes dos montes, murmuram os ribeiros nas azinhagas, ondulam as searas (muito bem!) e o jovial lavrador lá vai, satisfeito e alegre, cantando as deliciosas canções do campo, junto à esposa fiel, coroada das mimosas flores dos prados! (Bravo! Bravo! Sensação!).
Encerradas as sessões, Alípio Abranhos, sua esposa e o tenro Benvindo partiram para Campolide, onde iam passar o Verão. Foram três meses de concentração, de íntima felicidade. Tinham passado ali, havia um ano, a sua lua de mel, e a sombra de cada
árvore, cada moita de flores, possuíam para eles o valor de uma recordação deliciosa: a quinta tornara-se-lhes como uma vasta confidente simpática; era com orgulho que lhe levavam o tenro Bibi, rabujando nos braços da ama, como o fruto vivo do amor que ela protegera.
Mas nem por isso Alípio Abranhos ficou inactivo. Trabalhou muito e ali escreveu trechos, imagens, perorações de futuros discursos. Foi ali também que ele tomou, passeando à tarde na bela alameda de loureiros, como costumava, devagar, com as mãos atrás das costas, a resolução importante que devia ter na sua carreira uma influência
tão grave.
O ministério Cardoso Torres, ao fim da última sessão parlamentar, estava gasto. Esta expressão a que eu chamaria, se me não contivesse o respeito, a «gíria constitucional», refere-se a um fenómeno venerável e repetido, que eu nunca compreendi bem, apesar das explicações benévolas que me foram dadas por
conservadores, republicanos e cépticos.
Há ministérios que se gastam. E todavia, esses ministérios, como os outros, administram o tesouro com honestidade, fazem o expediente das secretarias com suficiente regularidade, mantêm no país uma ordem benéfica, não oprimem nem a imprensa nem a consciência, são respeitosos para com o Chefe de Estado, acompanham com dignidade, ao Alto de S. João, todos os defuntos ilustres, falam nas Câmaras com honrosa correcção, são na vida privada cidadãos estimáveis, e no entanto – ao fim de alguns meses desta rotina honesta, pacata e higiénica – gastam-se.
Gastam-se porquê? Compreende-se que um ministério que luta com dificuldades, que se coloca ao través da opinião pública, se gaste, como ao través de um frágil estacado que uma corrente hostil incessantemente bate. Compreende-se ainda que um governo criado especialmente para resolver certas questões sociais ou políticas, se torne desnecessário, desde que as tenha resolvido, e fique como o zângão que fecundou a abelha e é daí em diante um inútil.
Mas quando se não dá nenhuma destas hipóteses, quando os ministros não foram trazidos do seio da sua família para resolver questões sociais, – ou porque as não haja, ou porque seja um princípio tacitamente estabelecido deixá-las sem resolução –
quando, em lugar de se esforçarem contra a larga corrente da opinião, os ministros lhe bolam regaladamente no dorso, não compreendo como um ministério se possa gastar.
Um dia pedi respeitosamente ao Conde d'Abranhos a explicação da palavra e do fenómeno, e S. Exª, o que raras vezes sucedia, deu uma resposta vaga, tortuosa, reticente:
– É uma coisa que se sente no ar. É um não sei quê... Sente-se que a situação está gasta...
Não me permitiu o respeito que insistisse, mas, no fundo do meu entendimento, guardo um secreto terror por este fenómeno incompreensível!
O ministério Cardoso Torres estava portanto gasto. Calculava-se que ele pudesse talvez sobreviver durante grande parte da próxima sessão, mas, para o fim de Abril, devia desaparecer subitamente, como tinham desaparecido os Bexigosos e a corveta Saragoça!
O Partido Nacional retomaria então o poder, e Alípio Abranhos que, agora, era Governo, Influência, Força, Lei, passaria a ser o deputado loquaz de uma oposição estéril, pois que ninguém acreditava que os Reformadores – a que pertencia Cardoso Torres – tendo subido ao poder por um acaso, vissem esse acaso repetir-se.
Os Reformadores eram pois, na frase clássica, «um partido sem futuro». O próximo ministério Nacional havia de colar-se às cadeiras do poder durante anos. E poderia, durante anos, Alípio Abranhos ver as suas faculdades, o seu génio, gastarem-se na retórica hostil e rancorosa da oposição?


in "O Conde d'Abranhos", Eça de Queirós

domingo, maio 08, 2011

Filmes - Tempo de Glória ("Glory")


Já há algum tempo que andamos a entreter a nossa hora de jantar, ou o período que se lhe segue, antes de o Martim se deitar, assistindo a filmes ou séries em DVD. E desde que começámos que alimentei a intenção de ir procedendo aqui ao registo dos mesmos. Hoje foi a vez de Tempo de Glória ("Glory"), um grande filme sobre a participação de soldados negros na Guerra da Secessão americana. As actuações de Matthew Broderick, Denzel Washington, Morgan Freeman e uma banda sonora excepcional conferem-lhe o poder de me comover. Dependendo da criança, pode ser demasiado violento ou impressionante. Esse não é o enfoque do filme, e o Martim tolerou bem. E penso que aprendeu alguma coisa.